Separação e volta para a colmeia
Autor: Pierre Scordia
Nos sentíamos bem próximos como almas gêmeas antigas que finalmente se reencontravam após uma longa travessia no deserto. Uma profusão de emoções nos intoxicava; estávamos felizes, satisfeitos, otimistas e em plena harmonia com o universo. Nos prometemos coisas boas, viajamos juntos, nos inserimos no mundo do outro, nós nos identificamos com o ser amado. Formamos uma família unida.
Entretanto, diante da adversidade, começam a surgir pequenas tensões que em um primeiro momento nos surpreendem, mas com as quais vamos nos acostumando. Com o passar dos dias, das semanas, dos meses e dos anos, a cruel rotina habitual mata gradualmente a nossa alegria infantil. Envelhecemos, amadurecemos e racionalizamos. A longa aventura torna-se um caso do qual cada um tira o melhor proveito e se beneficia até o dia em que um é desestabilizado por uma demissão, uma doença, uma aventura rejuvenescedora ou simplesmente pelo “spleen” de Baudelaire. O outro torna-se assim, o peso, a carga. O amor antigo agora representa o tédio e a estagnação.
A alma guerreira procura então, ou reparar a relação por meio de uma comunicação construtiva, ou tenta encontrar a coragem de romper. O grau de consenso varia de acordo com o estado de vulnerabilidade. O medo ou a vitimização frequentemente precipitam a despedida e transformam a alma gêmea em uma entidade caída no esquecimento. As paixões, a desordem, os ferimentos, os sentimentos, os horrores, a agitação, as angústias, os tormentos germinam sob a forma de rancor, de recriminações, de choro, de nostalgia, idealização, arrependimentos, raiva, gritos, vingança ou ódio. Nos sentimos despossuídos, traídos ou abandonados.
O que esquecemos é que a felicidade de outrora, os momentos mais alegres vieram do nosso íntimo, que nós chamaremos aqui de "colmeia". Na realidade, esta felicidade nos pertence, como o mel pertence à colmeia. É nossa a escolha de transformar o néctar em mel. Somos livres para partilhá-lo com o outro.
Com o tempo, a dor desaparece e o esquecimento se instala. Mas a tomada de consciência da existência desta colmeia interna nos abre outros horizontes bem mais suaves e mais ricos. A aceitação da separação se revela, desse modo, como uma grande oportunidade de seguir em frente, de evoluir e de brilhar recuperando o equilíbrio. Desta forma, devemos agradecer à alma que nós amamos pelos momentos de alegria proporcionados e pela oportunidade de viver um renascimento sem ela.
form-idea.com Brasil, 18 de dezembro de 2016. Com agradecimientos a Rejane Amaral e a Laís Amaral.
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